Por
Zélia Chamusca
Existem várias
argumentações sobre a origem do célebre incêndio de Roma, em Julho do ano 64,
um dos mais instigantes crimes da Antiguidade, sendo a mais comum das
argumentações a atribuída à mentalidade perturbada do jovem Imperador, Nero, que
mandou incendiar a cidade para seu bel-prazer, pois, enquanto o fogo consumia a
cidade, maravilhado com o espetáculo, tocava lira para se inspirar
poeticamente a fim de criar uma obra como a Odisseia de Homero em que nos conta
a gloriosa história de Ulisses, homem de mil façanhas e ardis, e, do cerco e
tomada de Troia destruída por um incêndio.
O célebre
romance “Quo Vadis”, do escritor Polaco, Henryk Sienkiewicz (1846-1916) que tem
por tema a perseguição dos cristãos após o grande incêndio de Roma, apresenta-nos a atrás referida cena de
Nero a tocar lira enquanto se maravilha com o espetáculo do incêndio.
Este romance
teve várias adaptações cinematográficas desde 1901 a 2001, tendo sido
apresentado em Portugal
nos anos oitenta, penso que seja a versão italiana de 1985. A última
versão foi a polaca em 2001.
Eu tive o
privilégio de ver este maravilhoso e espetacular filme. Desde muito jovem que
me interessei pelos filmes históricos e bíblicos.
Voltando às
diversas argumentações sobre a origem do célebre incêndio, há historiadores que
alegam que Nero estava a quilómetros de distância da cidade e que diligenciou
para que os danos fossem aplacados tanto quanto possível. Dizem, ainda, que quando
soube o que estava a acontecer regressou, rapidamente, para prestar auxílio aos desalojados
tendo-os, até mesmo,recebido nos jardins do seu palácio.
Houve, contudo,
romanos que chegaram a afirmar ter visto Nero a distribuir focos de incêndio
pela cidade.
Alguns
historiadores afirmam ter sido a origem do incêndio numa das habitações que
eram na época construídas em madeira e que tendo o incêndio decorrido em Julho,
o clima seco e quente facilitou a sua propagação.
Outros
historiadores alegam ter sido Nero o autor do incêndio para incriminar os
cristãos por ele perseguidos, tendo até alguns sido condenados à morte.
Ainda, outros
dizem que Nero originou o incêndio porque pretendia reedificar parte da cidade,
que não era do seu agrado, tornando-a mais poderosa mediante uma outra arquitetura
majestosa incluindo a edificação dum novo palácio mais sumptuoso.
Porém, o que o
colocou Nero numa situação suspeita foi o facto de ter comprado as terras
atingidas por um preço muito baixo.
Seja o que for
a verdade da história, é que, a atuação de Nero não agradou a alguns setores da
nobreza que viram as suas moradias imperiais afetadas pelo incêndio, e, havendo
outros interesses e suspeitos intervenientes nas diversas polémicas sobre as
destruidoras chamas, Nero foi alvo duma revolta militar que o forçou ao
suicídio.
Esta é a
história do célebre incêndio, registada na minha memória, que é parte do conhecimento
cultural que me foi transmitido pelos professores e pelo que li, quando estudei
História Universal.
Falar deste
instigante crime da Antiguidade, não era, de modo algum, a minha ideia, mas, a
verdade é que depois de, desde há quatro meses ouvir, dia e noite, falar de
incêndios e, repito, dia e noite ver Portugal
a arder permanentemente, veio à minha
lembrança o Imperador Romano, Nero,
considerado um louco e o célebre incêndio por ele perpetrado, as negociatas que
já existiam na altura e que geraram o conflito que o coagiu ao suicídio.
E lembrei-me da
versão de alguns historiadores sobre a pretensa inspiração poética de Nero para
criar uma obra semelhante à de Homero onde pudesse relatar o incêndio de Roma
tal como Homero o faz, na Odisseia, relativamente a Troia, facto que me parece inverosímil,
porque um génio é inigualável.
Porém,
parece-me verosímil as possíveis negociatas económicas, já existentes nessa
altura e, para mim, no meu país “de brandos costumes” talvez equivalentes, mas,
na realidade, hoje, ainda misteriosas.
Verosímil,
também, de certa forma, ou mais propriamente uma certa semelhança por antagonismo, porque
não gosto de ver o meu belo país, considerado um paraíso à beira mar plantado,
sendo destroçado pelos devoradores incêndios provocados por mão criminosa e
mentes malévolas, diabólicas. Não, nisto não há em mim qualquer verosimilhança,
porquanto não gosto de ver os incêndios destruidores e fico nervosa, irritada
por ver que não há quem ponha cobro a tão hediondo crime e não preciso de
inspiração para escrever e se precisasse nunca seria neste, nem em nenhuma outra
forma de terrorismo. O crime não me
inspira, muito menos poderia pretender criar uma obra com o valor e arte do génio
Homero. Só poderia ter sido ideia de Nero, segundo determinada versão
histórica, em que é tido como um ser perturbado mentalmente, o que para mim não
me parece verosímil como atrás referi.
É verdade que
tenho escrito na forma poética, porém sem qualquer poesia, é a realidade pura
do espetáculo abominável, destruidor e triste que os incêndios causam. O que
me move não é, de forma alguma, a inspiração mas sim a revolta, a tristeza e
dor que tão hediondo crime me causa.
Quem me dera não
ter tido a necessidade de escrever sobre tão triste tema que causou tanta morte,
dor física e psíquica a tantos que estarão afetados para o resto das suas
vidas.
E é
verosimilhante, muito mais ainda, porque Nero foi acusado de ter mandado
incendiar Roma. Mas, quantos Neros terão mandado incendiar Portugal desde há 3l
anos, em que durante todo o verão, não pára nunca de arder dia e noite?
Sim. Quantos
Neros são necessários para tantos incêndios, permanentemente, ativos? Extinto
um, surge outro e muitos outros, sendo que este ano, desde há 4 meses, num só dia chegaram a estar
280 incêndios ativos, e, continuarão até que chegue o inverno quando restarem,
apenas, cinzas que serão varridas pelas chuvas para os rios onde acabarão por
morrer todos os viventes que, ainda, resistem.
Quantos Neros
existem e qual o seu rosto?
Um dia a história
contar-nos-á a verdade.
Zélia Chamusca